quinta-feira, abril 20, 2006

"Preciso que aqueles que me amam me perdoem.
Que me perdoem porque – preciso confessar – eu me pareço com os esquilos...

É. Eu me pareço com os esquilos...
Esquilos são animaizinhos deliciosos, com sua longa cauda peluda.
Qualquer um gostaria de tê-los no colo e acariciar seu pelo liso.
Assentados, eretos, olhinhos assustados,
eles seguram as nozes com as mãos
e as mordiscam de um jeito que faz lembrar os humanos.
Me disseram que eles têm o costume de guardar enterradas as nozes que não comem,
com a intenção de comê-las mais tarde,
quando os bosques se cobrirem de neve.
Me disseram mais, que eles têm memória curta;
esquecem-se dos lugares onde guardaram suas preciosas nozes.
Pois eu sou assim:
guardo coisas preciosas para degustá-las num momento de calma
– e depois me esqueço.
E elas ficam enterradas em gavetas e caixas até que,
acidentalmente, as encontro de novo.
Acham que fico alegre? Enganam-se.
Fico muito triste.
Porque elas não poderiam ter sido esquecidas.
As nozes, acho que elas até ficam alegres por terem sido esquecidas.
Esquecidas, elas não são comidas pelos esquilos.
Quando a primavera volta elas germinam, brotam, nascem e se transformam em árvores.
Toda noz quer virar árvore.
Mas as coisas preciosas que ficaram esquecidas nas minhas gavetas
e caixas não poderiam ter sido esquecidas
– porque elas me foram enviadas precisamente para que eu as comesse.
Foram presentes de pessoas que me amam, gestos de carinho.
E o que elas receberam de mim, em troca do seu gesto, foi o silêncio..."
(Ruben Alves)

www.rubemalves.com.br/precisoqueaquelesquemeamammeperdoem.htm

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